Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

O que dizem por aí

Procuro ouvir mais do que falo. Também escrevo mais do que converso, porque, com os dedos, a gente acaba falando menos pelos cotovelos. E falar pelos cotovelos não é bom negócio para ninguém. Sendo assim,depois de muito ouvir, resolvi descer acaneta para aliviar os pensamentos.

A começar pelo embate, ontem, no Clube da Janta, no Bar do Altair. Osmar e Adelson ferveram para defender suas ideias em relação à sucessão presidencial. Não entrei na questão porque queria ficar de fora para ter opinião distanciada e escrever com lucidez sobre o assunto.

Interessa-me muito, claro, a política brasileira. Cresci educado pelo velho Botelho, que sempre defendeu que todo cidadão precisa ficar atento a tudo o que diz respeito ao seu país. O Brasil é um país maravilhoso. Tem lá os seus problemas, é verdade – qual país não os tem? O fato é que podemos contribuir muito com os rumos da nação.

Quanto maior o interesse do cidadão, maiores são as chances de avanço. Eleitor interessado, consciente, acompanha o histórico do candidato e seu programa de governo. Procura saber quem são os seus aliados e tem tudo ali, na ponta do lápis.

Não é fácil, mas o velho Botelho, aos 70 anos, não deixa passar nada batido quando o assunto é política. É exemplo para a família e para os amigos. Sempre foi assim. Osmar e Adelson, embora defendam candidatos diferentes, por mais incrível que possa parecer, estão cobertos de razão. A discussão esquentou por razões igualmente nobres. Ambos querem o melhor para o Brasil e, por isso, têm acompanhado tudo de significativo que ocorre no cenário político nacional.

Demonstram preparo para defender suas apostas. Inflamam-se com os amigos e conhecidos desinformados, de onda e pouca opinião, tomados pelas ideias dos outros. Osmar e Adelson, amigos de longa data, são muito diferentes. Em comum, o amor incondicional pela família, a fé no Brasil e a dedicação extrema ao trabalho. No resto, são água e vinho.

Quando o assunto é política, então, é um deus-nos-acuda. Aí, na segunda-feira, deu no que deu. Tomei nota de tudo para dividir com o amigo leitor. Não vou fazer referência a este ou aquele candidato por princípios. Entendo que o melhor é filtrar o que há de mais positivo em debates assim. O que dizem por aí não é tão relevante quanto parece. Importante é o voto estudado, consciente.

É saber que nossa atitude diante das urnas influencia os rumos do país. Dizer em todas as rodas que todo político é corrupto não adianta. Mesmo porque, sabemos todos, existem homens de bem que trabalham pelo Brasil. Quanto aos corruptos, não é tão difícil identificá-los. Estão por aí, aos montes. No dia da eleição, conscientes, podemos varrê-los definitivamente da vida pública. Aos amigos do Clube da Janta, o meu abraço.

Bandeira Dois - Josiel Botelho - 29/9/10

sábado, 25 de setembro de 2010

Antes que o amanhã aconteça (3)

Ariela insistiu. Queria ter certeza de que Dorinha não tinha preconceito. A cantora não negou seu estranhamento com aquele encontro. Afinal, pela primeira vez na vida, estava tomando café da manhã com uma garota de programa, que acabara de conhecer e que tinha sido surrada pelo pai. Nada de anormal até ali, especialmente para quem passou os últimos dias de amor não correspondido por jovem evangélico, apaixonado por outra dona do quadril surrado.
Curiosa, a boa anfitriã quis saber mais sobre a menina do olhar perdido:

– Você mora perto daqui?
– Não. Fica longe. Lá no Milionários.
– Perto do Cristo?
– Você conhece alguém lá?
– Um casal de amigos.
– Lá tem muita gente de bem.
– Eu sei. Por isso que eu mais quatro amigas fomos morar lá.
– Fizeram uma república?
– É quase uma casa de família.
– Você não tem mãe, irmãos?
– Tenho. Moram no interior de São Paulo. Depois que o pai deixou a mãe, meu irmão mais velho, que é metalúrgico, levou todo mundo pra morar com ele.
– E você?
– Também fui. Mas a gente nunca se deu muito bem e lá foi pior. Aí, voltei pra ficar com o pai e virei ovelha negra na família. Não querem me ver nem pintada de ouro.
– Você morou muito tempo com o seu pai?
– Uns dois anos.
– Ele sempre bateu em você?
– Não. Ele sempre foi muito bom. Hoje foi a primeira vez.
– E por que você não continuou com ele?
– A mulher dele tanto fez que me colocou para fora. A gente ficou dois anos sem se ver.
– Essas coisas acontecem.
– Esta semana, soube que a piranha encheu a cabeça dele de chifre e foi embora com um capoeirista. Consegui o endereço aqui do JK, ontem, com um amigo da polícia.
– Aí, me deixa adivinhar, você veio ver se ele estava precisando de alguma coisa e acabou apanhando? É isso?
– O pai andou com problemas sérios de saúde. Só queria saber se estava bem. Ele ficou fazendo um monte de pergunta e a gente acabou brigando.

A puta tentou segurar tristeza. Firme, deixou única lágrima borrar a maquiagem.

(Continua no próximo sábado)

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 25/9/10

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Homenagem a Mauro dos Reis

Na semana passada, sexta-feira, lá se foi para a outra morada o bom e gentil Mauro dos Reis. Segurança de um banco privado na Avenida Getúlio Vargas, no Bairro Funcionários, dedicado, Mauro não era de muita conversa. Bem pouco o conheci, mas o suficiente para saber que se tratava de homem de bem. Tive oportunidade de trocar algumas ideias com o bom moço. Sempre fora do expediente, porque em serviço parecia não ser de conversa. Sem o uniforme parecia mais maestro, doutor ou pianista. Conversamos sobre arte algumas vezes e ele demonstrava muito interesse pelo assunto.

Delicado, de fala mansa, pura simpatia, aos 54 anos deixa família e muitos amigos.

Entristeceu-me um bocado saber da morte do Mauro. Nem minhas convicções budistas e espíritas foram capazes de aliviar o sentimento ruim pela morte do Mauro. Infarto. O pior é que ele, sentindo-se mal, procurou ajuda médica. Pelo que soube, disseram que era estresse e que ele precisava caminhar. Foi caminhar e teve um piripaque. Não resistiu. Agora, martela-me a cabeça: o que leva um médico a dispensar um paciente com todos os sintomas de algo mais grave? Disseram-me que ele se queixava de fortes dores no peito e formigamento nos braços. Estresse? Francamente.

Deus tem lá os seus propósitos. É chegada a hora, não tem jeito. Não há uma folha sequer no chão sem o sopro do Criador – tenha ele o nome que for. Mauro dos Reis tinha tudo para ser muito querido. Seus mais próximos falam com muito carinho de sua passagem neste plano, campo de aprendizado e de lições de dor. Sabemos todos que há muita alegria, mas, também, muita dor. Morremos pouco a pouco a cada dia. De repente, assim, num estalar de dedos, lá se vai o corpo. Imortal é a consciência ou a alma – sei lá que nome mais adequado dar à energia que habita esta carcaça frágil de carne. Não é fácil compreender isso.

Ao bom Mauro dos Reis, a homenagem de nosso Aqui. Estive no posto de atendimento que você guardou tão bem por tanto tempo e havia um vazio triste entre as duas moças que lá continuam a trabalhar. Você foi lembrado com muito carinho pela generosa caixa, pela gentil gerente e pelos clientes que estavam na fila. Lamentamos sua ausência. Muita luz caminho adiante, meu velho!

•••

P.S. Última semana para ver Vila dos mortos, em cartaz no Teatro do Colégio Arnaldo (Rua Timbiras, 560 - Funcionários). Sexta-feira e sábado, às 21h; domingo, às 19h. O espetáculo traz o "outro lado apenas como um ponto de vista". São 18 atores em cena tratando a morte com muito respeito. Vale conferir!

Bandeira Dois - Josiel Botelho - 22/9/10

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Deus nos acuda

Hoje, às 20h30, tem ensaio aberto de "Deus nos acuda", novo trabalho em parceria com a Cangaral Produções Artísticas. Em cena, Heloisa Prado, Ilvio Amaral e Maurício Canguçu. Vai ser bom ver os amigos por lá (PUC, Praça da Liberdade. Av. Brasil, 2.023. 1º andar).

domingo, 19 de setembro de 2010

Existe vida depois da vida?



"Vila dos mortos", peça de formatura levada adiante por atores profissionais vindos da Escola de Teatro Puc Minas, segue temporada de sucesso no Teatro do Colégio Arnaldo (Rua Timbiras, 560 - esquina com Av. Bernardo Monteiro - Funcionários). Hoje, às 19h, o público pode conferir porque "Vila dos mortos" começa a ganhar espaço entre as pessoas de bem de Belo Horizonte.

"Numa cidade qualquer, num bairro qualquer, numa rua qualquer, numa casa que bem poderia ser a sua, tudo parece normal, corriqueiro, mas há algo fora do lugar, algo fora do comum. Algo nas vidas que se entrelaçam evoca a mortalidade, o efêmero momento em que a chama se apaga, mas em que o sopro da vida, suspenso num universo paralelo, continua a perpassar as “vidas pequenas na esquina”. Seis casas, seis estórias, seis mistérios, talvez uma última chance de dizer o que não foi dito, de viver o que não foi vivido."

Mais informações:
http://viladosmortos-apeca.blogspot.com/

sábado, 18 de setembro de 2010

Antes que o amanhã aconteça (2)

“Trabalho na Guaicurus. Conhece?”, perguntou Ariela. “Já ouvi falar”, respondeu Dorinha. O toque de tema infantil do celular da garota interrompeu a conversa. Ela identificou o número no visor e não quis atender. Deu “end” por três vezes e, por fim, desligou o aparelho. Pediu para ir ao banheiro e disse que estava melhor: “Minha gengiva já até parou de sair sangue”. As marcas deixadas pelo taco de sinuca do pai eram de fazer dó. As belas e longas pernas em vergalhões, mais uma vez, chamaram a atenção de Dorinha, que queria denunciar o velho. Quando Ariela voltou, a cantora tocou no assunto:

– Se eu fosse você denunciaria.
– Não adianta.
– Claro que adianta. Manda ele pra cadeia pra você ver.
– Ele já foi da polícia.

Ananias foi inspetor por quase três décadas. Linha-dura. Homem da lei, do tipo raro, incorruptível. Há cinco anos, aposentado, largou a família por causa de rabo de saia mais jovem. Uma mulata de boas carnes, ordinária até, que aproveitou ao máximo o dinheirinho suado do babão apaixonado e, depois, deu no pé com namoradinho baiano. Há pouco mais de mês, desde que foi largado, o ex-policial estava morando no JK. Apesar da surra, Ariela não escondia afeto pelo sujeito.

– É meu pai.
– Mas não tem o direito de bater em você. Olhe as marcas nas suas pernas.
– Não é nada.
– E o sangue na sua boca?
– Não tem nada a ver com ele.

Enquanto conversavam, Dorinha preparou mesa para o café da manhã. O schnauzer, serelepe, fazia gato e sapato de brinquedinho desafinado. Com os bons tratos da vizinha do pai, Ariela foi se entregando à amizade. A doçura da desconhecida despertou-lhe sentimentos havia muito esquecidos. A menina de olhar assustado abriu a guarda e deixou correr assunto:

– Você se importa?
– Com o quê?
– Em tomar café com uma puta?
– Claro que não. Sou cantora da noite.
– Que que tem?
– Já fui tratada como garota de programa muitas vezes.

(Continua no próximo sábado)

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 18/9/10

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

A postura, senhor candidato!

Antes de levar adiante a escrita sobre os senhores candidatos à vida pública, é preciso comentar a repercussão de “A vida depois da vida”, publicada em Bandeira dois na semana passada. O texto sobre o filme “Nosso lar”, baseado na obra de Chico Xavier, deu o que falar entre leitores, amigos e amigos leitores. Muita gente de bem foi ao cinema conferir a película. A maioria absoluta gostou e recomenda. O boca a boca está funcionando que é uma beleza: as salas de exibição estão lotadas e o filme vem sendo comentado em muitas rodas. Na praça, entre os conhecidos, fala-se muito no assunto.

Por estas bandas de papel, teve leitor que ainda não havia assistido, mas, ainda assim, quis comentar a publicação de nosso Aqui. A Iracy Pessoa, leitora muito querida, por e-mail, escreveu: “Josiel, bom dia. Gostei muito da sua coluna sobre o filme NOSSO LAR. Sou espírita e não vi o filme ainda, mas desejo que todas pessoa tirem as mesmas conclusões que você tirou. O importante é viver bem, para ser feliz aquí e do outro lado também. Se você tiver oportunidade leia o livro, vai te esclarecer melhor. MUITA PAZ!!! Iracy”. Obrigado pelo carinho, Iracy. Fica também um abraço pelas mensagens recebidas para Adélia, Lucas, Marta, Raquel, Luís, Osmar, Cristina e Kelly.

Agora, vamos ao tema principal de hoje: campanha política. A gente que roda muito pela cidade, em época de eleição, vê cada coisa do arco da velha. Impressionante como tem gente que promove a verdadeira anti-campanha. Vou explicar. É que o sujeito, às vezes, parente ou amigo – até funcionário, quem sabe – prega propaganda gigante deste ou daquele candidato nos vidros e nas latarias do carro e sai por aí fazendo bobagem. Aí, certamente, é voto perdido que se multiplica.

O Adelson, por exemplo, tem uma caderneta só para anotar os números estampados de fora a fora nos carros dos maus motoristas. Segunda-feira, meu parceiro de carteado estava inflamado: “Anoto mesmo, Josiel. Não tô falando de adesivo pequeno não. Tô falando é daqueles posters que só pode ser coisa de parente. Tomo nota e ainda falo pra todo mundo que conheço não votar no cidadão. Sei que o candidato até pode não ter culpa, mas é quem acaba pagando o pato”.

Fácil entender o Adelson. O tempo todo tem mané-barbeiro com o carro parecendo uma melancia aprontando no trânsito. Ontem, pela manhã, um sujeito quase me levou a lateral do carro na Avenida Afonso Pena. Inacreditável o jeito como o camarada estava conduzindo a melancia importada motorizada. Cortando todo mundo, sem dar seta e ainda falando ao celular. E o pior: era o próprio candidato a deputado no volante. A mesma cara encerada, sorridente, no vidro traseiro. Fiz como o Adelson: tomei nota na hora. Também fiz uma carta e encaminhei ao partido do infeliz. Será que já não basta a poluição visual do período? Portanto, fica registrado: olha a postura, senhor candidato! Meu voto esse moço da cabeça de prata não tem.

P.S. Aos espíritas fica a dica de bom programa: “Vila dos mortos”, peça teatral em cartaz no teatro do colégio Arnaldo (Rua Timbiras, 560 - Bairro Funcionários). Sexta e sábado, às 21h, e domingo, às 19h.

Bandeira Dois - Josiel Botelho - 15/9/10

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Os sem vergonhas em Contagem

Hoje, amanhã e depois, às 21h, tem "Os sem vergonhas" no 2º Festival de Comédia Abobrinhas de Contagem, no Cine Teatro, Praça Silviano Brandão, s/n, Centro, próximo à Igreja Matriz de São Gonçalo. Ingressos: R$ 20 e R$ 10 (antecipados). Informações: 3352-5321. Dirigido por Guilherme Leme, divido o palco com os companheiros André Prata, Leri Faria, J. Bueno, Ilvio Amaral e Maurício Canguçu. São apenas três apresentações (14, 15 e 16 de setembro). Espero vocês!

sábado, 11 de setembro de 2010

Antes que o amanhã aconteça (1)

O trem BH-Vitória seguia sobre os trilhos. No JK, Dorinha acordou com quebradeira no apartamento vizinho. Não chorou a falta do João. Sabia que não conseguiria prender o moço do Espírito Santo. Apenas sorriu ao ler o bilhete de gratidão e experimentar o anel de brilhante deixado pelos dias de gentileza. Raul, o schnauzer, estava inquieto com o barulho do lado de fora. A cantora foi até o corredor e viu o “seu” Ananias, descontrolado, com taco de sinuca quebrado na mão. Ao chão, com o rosto mergulhado entre os braços, a filha Ariela. “Não sou mais seu pai, vagabunda! Some da minha vista! Some!”, berrou. Quando viu a vizinha, o velho fez silêncio, lançou último olhar de fúria contra a menina e voltou à quitinete, batendo a porta com violência.

Dorinha se aproximou da garota e ofereceu ajuda: “Vem comigo. Faço um copo com água e açúcar pra você”. Deu-lhe a mão e apoio para ficar de pé. Ariela estava machucada. Por dentro e por fora. Sangrava na gengiva e tinha marcas nas pernas e nos braços. “Vou chamar a polícia!”, disse a cantora. “Não. Por favor”, pediu Ariela. Dorinha ficou bastante comovida com o estado da menina, que não parecia ter mais de 20 anos. Com os olhos cansados e o corpo franzino, de vestido curto, florido e barato, ela deixava evidente ter passado a noite em claro.

Copo de calmante nas duas mãos trêmulas, Ariela olhou para a mulher solidária como adulto carente do colo da mãe. Havia um grito de socorro perdido, parado no ar. Dorinha abraçou-a, carinhou seus cabelos maltratados e tentou saber melhor o que estava acontecendo:

– Quer conversar?
– Acho que sim.
– Posso ajudar?
– Ninguém pode.
– Como se chama?
– Ariela.
– Isadora. Mas desde criança me chamam de Dorinha.
– Também me chamam Laura e Angelina.
– Como assim?
– É que tenho outros nomes.
– Por que?
– Sou puta.
– Ah.
– Trabalho na Guaicurus. Conhece?

(Continua no próximo sábado)

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

A vida depois da vida

Feriadão de muito trabalho para dar jeito nas contas e nos compromissos. Cineminha também porque ninguém é de ferro. E se taí um programa que Violeta e eu gostamos é pegar um cineminha de vez em quando (quase sempre). Depois de “Karate Kid”, que valeu nossa Bandeira Dois da semana passada e muitos e-mails, domingo foi a vez de “Nosso lar”, baseado na obra de Chico Xavier. Um filme de recursos que merece ser visto por todo cidadão de bem, independente de credo ou religião.

Tenho minhas críticas técnicas ao filme. Não gosto da interpretação dos atores, do roteiro e acho que a direção não deu conta de dar forma à grandiosidade que tinha nas mãos. O longa-metragem, obra cinematográfica, não é bom. Contudo, o que vale no filme é a mensagem. É o que fica quando deixamos o cinema. Uma maravilha essa idéia de vida depois da vida. Emocionante pensar em reencontrar todos aqueles que amamos e que já não estão entre nós. Que seja assim, então, como mostra o filme.

A ideia de que todos os que maltratam a própria vida são suicidas é algo que também mexeu muito comigo. É verdade. Essa história da pessoa levar uma vida de excessos, sem tempo para a família, para os amigos, na bebedeira, no cigarro, nas drogas é, de fato, maltratar a si mesmo. E não há bem maior que a vida, sabemos todos. Se há algo de importante que fica depois de ver “Nosso lar” é a importância de fazer o bem aos outros e a si mesmo. Não por esperar algo em troca, simplesmente, mas para alimentar a imensidão de luz que há em cada um de nós.

Portanto, “Nosso lar” é uma obra do bem. Se o lado de lá é como mostra o filme, sinceramente, são outros quinhentos. Se tem computador, hospital, transporte público que voa, governadoria, pouco importa. É uma projeção apenas. “A vida na terra é que uma cópia da vida aqui”, diz, mais ou menos assim, um dos homens de branco de lá. Não é preciso acreditar em reencarnação para entender que somos aquilo que fazemos da nossa vida ou, ainda, que o fim pode ser só o recomeço. Por que não? Seria muita ingenuidade pensar que a vida é só isso, esse sopro na terra. E a força das marés?

O universo não cabe na imaginação do homem, pobre mortal tão imperfeito. No mais, é só observar a natureza. O sol, a lua e as águas. Uma gota no oceano não é gota. É oceano. Logo, nós no universo não somos nós. Somos o universo. Osho, mestre indiano disse isso. Não era de todo charlatão como o pintaram. Deixou pensamentos que merecem respeito. Vamos somando bons pensamentos aqui e ali, ensinamentos bíblicos, o que diz o bom padre ou o bom pastor, os espíritas, os budistas e os cristãos. Somos inteligentes o bastante para saber tirar proveito do que é bom em cada religião.

Tenho para mim, cada vez mais, amigo leitor, que o importante é manter-se na linha do bem. O resto é com o Deus que permitimos atuar em cada um de nós. Tenho certeza: Deus está aqui, em mim, em você. Veja “Nosso lar” e, se puder, me diga o que achou.

Bandeira Dois - Josiel Botelho - 8/9/10

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Show de gente grande

O mote é infantil, mas o espetáculo é de gente grande. Sensacional o show de lançamento do CD Música de brinquedo, do Pato Fu, no fim de semana. Lamentável apenas o número de cadeiras vazias, esnobadas por convidados ausentes. Uma pena. Sábado, dezenas de pessoas ficaram de fora por falta de ingressos na bilheteria.

Em Belo Horizonte, a performance dos “patos” era esperada com grande expectativa. Muita gente queria ver ao vivo o que, até para quem não se cansou de ouvir o CD, parecia inacreditável – afinal, os estúdios de hoje, mesmo os de fundo de quintal, são capazes de afinar tudo. Como seria, então, reunir todos aqueles instrumentinhos limitados sem os recursos tecnológicos?

O resultado é de cair o queixo. Que os “patos” são artistas excepcionais, até o outro lado do mundo já sabe. Agora, ver Fernanda Takai, John Ulhoa, Ricardo Koctus, Lulu Camargo, Xande Tamietti, Mariá Portugal e Thiago Braga fazendo música de qualidade ao som de cornetinha, telefoninho, pianinho, saxofoninho, bateriazinha e escaleta é de impressionar. Na plateia, a garotada até se divertiu. No entanto, foram os marmanjos quem mais curtiram Música de brinquedo no tablado. Groco e Ziglo, monstrinhos do Giramundo manipulados por Marcos Malafaia, Ulisses Tavares e Beatriz Apocalypse, assumem com eficiência a difícil missão que as crianças vocalistas cumpriram tão bem no CD.

À frente do palco, o casal simpatia Fernanda Takai e John Ulhoa comanda show cênico-musical inesquecível. Nada ficou fora do lugar. O acabamento impecável tem cenário de Andrea Costa Gomes e Fernando Maculan, iluminação de Adriano Vale e figurino de Ronaldo Fraga. Além de hits do novo CD, a banda incluiu no show outros sucessos da banda. Os destaques ficam por conta de Primavera (Vai chuva), Eu, Frevo mulher, Todos estão surdos, Live and let die, Love me tender, Rock and roll lullaby e Sobre o tempo. A turnê do Pato Fu segue para Recife, Brasília e São Paulo.

Estado de Minas - Jefferson da Fonseca Coutinho - 6/9/10

domingo, 5 de setembro de 2010

Música de brinquedo

Para quem não conseguiu ver o show sensacional do Pato Fu no Teatro Dom Silvério, neste fim de semana, aí vai o making of do CD Música de brinquedo. No espetáculo, em vez das crianças, entraram em cena dois monstrinhos do Giramundo.



Parte 1



Parte 2

12 anos de Espírito

Hoje, no Grande Teatro do Palácio das Artes, às 19h, tem mais uma sessão comemorativa pelos 12 anos de Acredite, um espírito baixou em mim, com Maurício Canguçu e Ilvio Amaral. Escrita por Ronaldo Ciambroni, com direção de Sandra Pera, a peça festeja 1,7 milhão de espectadores em todo o Brasil. Recorde absoluto da cena mineira. Parabéns à Cangaral Produções Artísticas e vida longa ao Espírito!

sábado, 4 de setembro de 2010

Rogerinho, o menino da cicatriz

São tristes as marcas da infância para muitos, mas para Rogerinho, que sonhava ser policial, foram ainda mais profundas. Houve até um talho de centímetros, logo abaixo do olho direito, feito a faca pelo próprio pai. Rogério, de Santa Efigênia, não era moleque qualquer. Deu-lhe, a natureza, biotipo de gigante: aos 7 anos, já aparentava mais de 10. Filho mais velho de dona Naná com o Guimba, biscateiro, alcoólatra, que gostava de descer a mão na mulher e nos seis filhos. Rogerinho, desde o colo, era quem mais sofria com a ignorância do pai. Tinha até queimaduras de cigarro pelo corpo, provocadas pela virulência do infeliz.

Dona Naná, sempre grávida, nada dava conta de fazer. Guimba não gostava do filho. Fazer o quê? Desconfiava da mulher por causa da pele e do cabelo liso do garoto. Bastava beber para esbravejar: “Olha o cabelo dessa porquera. Vê lá se isso aí é meu!”. Em seguida, sentava a mão em tudo o que aparecesse pela frente: pessoas, objetos ou animais. Já havia quebrado de tudo no barraco: filtro de barro, cadeira, rádio, panela, porta, pia e o vaso sanitário. Pisoteou pintinho, porquinho-da-índia e descadeirou a vira-lata com seus filhotes. Também quebrou o braço da mulher, grávida de oito meses. Dia em que, aos 4 anos, para defender a mãe, Rogerinho puxou arma branca para o pai. Guimba não só tomou a faca da mão do filho, como também a passou no seu rosto.

Não era difícil compreender o comportamento do menino da cicatriz, que queria ser policial. Rogerinho crescia friíssimo. No aglomerado, não havia vizinho de sua idade que aguentasse sair na mão com o moleque. Se em casa ele vivia de apanhar, na rua, era ele a descer a mão. As únicas pessoas que conseguiam mantê-lo com a cabeça no lugar eram as tias da Casa André Luiz. Mesmo assim, vez por outra, também arrumava confusão por lá. Num desses auês, quem diria, acabou ganhando um amigo: Vitinho. A amizade para valer veio no ano seguinte ao empurrão na fila da merenda. Rogério e Vitinho acabaram sentados lado a lado na turma da tia Lindeia.

O guri não era de muita conversa. Era bom de bola, finca e papagaio. Esforçado, gostava muito da escola. Certa vez, confidenciou ao Vitinho que queria morar na Casa André Luiz. Só tempos depois o amigo foi entender o porquê. Estudaram juntos por alguns meses apenas. Rogerinho foi obrigado a deixar a escola para ajudar a mãe a cuidar da família. Guimba, o pai, estava mal, pela hora da morte. Mãe grávida de um lado, pai acamado do outro, era o Rogerinho a fazer comida e a dar banho nos irmãos. Vitinho foi visitar o amigo numa tarde e jamais esqueceu o que viu: o moleque de 7 anos no tanque, lavando fraldas e mais fraldas de vômito e cocô.

Assim sendo a vida, cada um seguiu seu rumo. Rogerinho cresceu, ganhou maioridade e realizou dois sonhos antigos. Disso Vitinho soube pelas páginas dos jornais: “Policial mata o pai em legítima defesa”. Na foto, fardado, o menino da cicatriz.

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 4/9/10

Quase Funcionários



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quarta-feira, 1 de setembro de 2010

As lições de Karate Kid

Quando rapaz, lá pelos idos de 1980, fiquei bastante impressionado com a história de Daniel San e seu mestre Miyagi. Karate Kid chamou a minha atenção para valores até então desconhecidos e que, desde então, passaram a me martelar a cabeça. Parece que foi ontem e, desde o lançamento do filme, em 1984, já se vão mais de 25 anos. Uma nova versão do longa-metragem acaba de estrear nos cinemas do Brasil. É claro que eu não podia deixar de rever as lições de honra, tolerância e filosofia que me marcaram tão profundamente. Diria até, sem medo de parecer piegas, que taí a obra que redirecionou o curso da minha vida. Naturalmente, passei a associar as boas mensagens da história aos fatos que ocorriam ao meu redor. Elaborei um código de conduta a partir daí. Passei, por exemplo, a respeitar mais e melhor o velho Botelho e a entendê-lo, definitivamente, meu mestre Miyagi.

Para o leitor ter uma idéia do meu envolvimento com Karate Kid, passei a buscar Miyagis e Daniel Sans nos meus relacionamentos cotidianos. Dos mais rasos aos de mais elevado respeito. Surgiram amigos, parentes e colegas de trabalho que me fizeram lembrar os personagens do bem da aventura dramática. E vem sendo assim: pelo caminho, procuro identificar bons e maus mestres, assim como bons e maus colegas. É um bem e tanto perceber àqueles de honra. Um exercício diário em busca de discernimento. Não é fácil manter-se na linha. Não me refiro a uma linha de bem simples de caráter e humildade – pré-requisitos mínimos para qualquer cidadão de bem. Refiro-me ao respeito e à honra; ao entendimento da força da palavra; à lealdade; ao senso de justiça; aos ensinamentos que ficam para toda a vida; aos exemplos em casa, na escola e no trabalho, e por fim, à atitude que faz diferença. De resto, sobra um monte de manés voltados para o próprio umbigo.

Vê mal quem vê com os olhos. Há uma lição de observação e paz em Karate Kid que devia ser levada a sério por pessoas de todas as idades e posições. Meus garotos já a conhecem bem. Insisto sempre em lembrá-los continuamente para que sejam mais fortes e preparados. Que aprendam o real valor da disciplina com os pequenos afazeres domésticos. É difícil porque há uma arrogância natural no adolescente que não há pai ou mãe que dê jeito. Contudo, faço de tudo para estar por perto e ajuda-los na identificação das causas que os levaram aos erros ou ao resultado ruim de alguma empreitada. Gabriel e Tiago são bons filhos. No somar dos sins e dos nãos, no fundo, percebem que sempre aprendem alguma coisa. Além do que, é fato que, com um mínimo de inteligência, todos avançamos com os erros.

Por hora, como em Karate Kid, vou seguindo a pintar cercas e a dependurar a jaqueta. Até que esteja pronto para chutar o pau da barraca com a elegância de um grande samurai.

Bandeira Dois - Josiel Botelho - 1/9/10