Jefferson da Fonseca - Mostra Tua Cara

segunda-feira, 18 de julho de 2011

Um recado do Olimpo


O Olavo é um cara do bem. Bom moço em todos os planos, o jovem ator é daquele tipo de artista – diferentemente de muitos – que vive inteiramente a arte que há em si. “É um escolhido”, dizem os veteranos. Sabe bem mandar um texto e se comportar nos bastidores. Não gosta de fofocas, mexericos ou conversas lançadas ao vento. Aprecia boas intenções e acredita nas sérias relações de afeto e de trabalho. Sonhador, tem a cabeça no infinito, bem perto do Olimpo. Lá, onde agora deve sorrir o pai.

Dessas peças que só a arte sabe pregar, o pai do Olavo teve mal súbito. Isso, dias antes de nova estreia do filho. No CTI, em estado grave, o homem motivou o herdeiro, fiel escudeiro, a não deixar de lado o sonho de viver dignamente como ator. Já tarde da noite, com a força que lhe restava, o bom homem disse palavras de disciplina e esperança ao garoto, que deixou o hospital com muita fé na recuperação do pai. Enquanto o sol se levantava, quis o universo, o pai do Olavo partiu.

Silêncio de saudade e dor. Emudecido, o artista, estudioso das emoções construídas, experimentou sentimento que não se mente, que não se repete. Repassou a vida de três décadas como um filme. Lembrou-se do pai na plateia, em muitas de suas estreias, com a melhor cara do mundo. Ocasião em que, quase num ritual, o velho (nem tão velho assim) gostava de usar as roupas novas do filho sem que ele soubesse. Do palco, Olavo se divertia ao ver o pai estreando seus panos de bom gosto.

“Quer saber?”, pensou Olavo, “vai ser como sempre foi”. Confidência guardada entre os dois. E assim, separou roupa nova para vestir o pai. Decidiu ele mesmo preparar o corpo do velho para o sepultamento. Com o coração em frangalhos, amparado por braços camaradas, o moço se despediu do pai-amigo para tocar adiante a vida. Havia muito a fazer. “A dor faz crescer homens de verdade”, é o que costumam dizer. Com o Olavo não seria diferente.

Ainda mais dedicado, voltou aos salões de ensaio para vencer caminhos. Pouco tempo passado, reencontrou conhecido espírita, de quem havia muito não tinha notícia. Um abraço apertado e um recado do Olimpo, soprado em segredo: “Olavo, seu pai mandou agradecer a roupa nova”.

Vida Bandida - Jefferson da Fonseca Coutinho - 18/7/11

2 comentários:

Iris Prates disse...

Belo texto, Jefferson!

Mel Miranda disse...

É mesmo um belo texto!..Jefferson, como voce retratou bem o Olavo: menino bom/homem de bem!..e que recado reconfortante! Um abraço para os dois!